Tuesday, April 13, 2010

Sabes que mais?... Vai-te lixar!

Vai, vai e foge para onde quer que disseste que ias, para esse sítio chamado longe-de-mim; deixa-me na paz provinciana do fim-de-tarde de Domingo do Bairro. Quero lá saber se estou a fazer uma cena e se toda a gente está a ver! Empurro-te, grito-te que te vás, bato-te com os punhos fechados e viro as costas. Caminho sem olhar para trás e contenho as lágrimas - vou aguentar, oh se vou, pelo menos até virar a esquina; nem sequer deixo que me vejas levar a mão à cara para limpar este rio de que és a nascente. Mais uns passos... Mais um...

Dobro a esquina e desato a correr. O meu lenço cai-me do pescoço e eu não paro para o apanhar. Não sinto as pernas, não sinto as mãos, não sinto o meu coração, NÃO SINTO NADA! Estou anestesiada pela bofetada da tua cobardia e desconsideração! Corro, corro pelas vielas emaranhadas, os meus sapatos ecoando sobre o chão empedrado, gasto e sujo, fintando os estendais pingantes de roupa branca, evitando as poças de água estagnada… Embato abruptamente no gradeamento antigo e ferrugento do miradouro e deixo-me estar assim, por momentos, semi-pendente no abismo da cidade. É tudo calmo e silencioso, visto cá de cima; tudo tão incomplexo e descomplicado. O tempo pára, enquanto estou assim, meia suspensa, mas eu sei que não é por muito tempo - o relógio vai arrancar não tarda e não vai desfazer nada do que foi ou do que é.

…Então recuo. O vento assobia-me nos ouvidos e traça gélidos caminhos na minha face; passo os dedos pelos malares, pelas bochechas, pelo queixo… tenho a cara molhada. Nem sequer me dei conta. Percorre-me um arrepio cruel, acre, corrosivo. Já não estou dormente, já sinto. Esfrego os braços. Não chega. Abraço-me, tentando que a constrição me contenha – ameaço esvair-me por entre os meus próprios dedos, feita líquido, feita água, feita lágrimas inglórias e sabor a fel. Já sinto. Odeio-te. Credo, como te odeio. E a mim. E a nós. Fazes-me mal. Vai, mas vai para longe.

Limpo a humidade da cara, e passo o lenço de papel de baixo dos olhos – tenho a maquilhagem esborratada. Puxo o cabelo para trás e respiro fundo. Está a fazer-se noite. Vou à Baixa: preciso de comprar um lenço.